terça-feira, 18 de setembro de 2012

Estudo crítico das ameaças do novo Código Florestal para o campesinato marcam o início da semana de formação de lideranças do MPA regional nordeste


Gabriel Troilo
Especialmente para a pagina do MPA
 No dia 10 de setembro segunda-feira iniciou-se a escola de formação política do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) regional nordeste, onde cerca de cinquenta lideranças camponesas de diversas localidades estiveram reunidas no centro de formação Paulo Freire, nas redondezas de Caruaru (Pe).
 O primeiro dia contou com um espaço de estudo e debate sobre as consequências da  desregulamentação do Código Florestal para o campo brasileiro e as relações deste processo com o avanço do capital internacional sobre os territórios naturais dos países latino-americanos. Com o objetivo de garantir o avanço na apreensão crítica das relações de poder envolvidas no desmonte do código o método utilizado para o espaço propôs um movimento de compreensão tanto dos fatos políticos imediatos como também dos processos conjunturais relacionados. Assim, para o debate inicial foi feita uma análise das modificações propostas pelo congresso que representam um grave retrocesso para a política ambiental, e, partir destes pontos, foram lançadas provocações para que o debate se direcionasse para além do que se mostra na aparência como desastre ambiental, chegando às relações de forças políticas que expõe o embate de classes na sociedade brasileira  e o aparelhamento do estado pelas elites ruralistas.   
 Qualificando o diálogo com a identificação do próprio código florestal como uma forma de regulação das relações entre sociedade e natureza, nos retratamos aos fundamentos da economia politica para reafirmar a centralidade do trabalho e do desenvolvimento das forças produtivas sociais no avanço da sociedade industrialista/consumista moderna. A reflexão se voltou para o modo como a natureza é isolada do homem, sendo tratada de forma utilitária, como estoque de recursos a serem transformados em riquezas. A natureza como objeto da ação humana aliada à exploração do trabalho e o conceito de falha metabólica entre cidade e campo foram temas que abriram o debate sobre os prejuízos desta forma de organização social. As contradições logo desveladas em relação à forma de contestação social moderna mais abrangente na atualidade, o movimento ambientalista, mostraram como a visão de natureza isolada remete à formas de resistência em preservar o meio ambiente também isolado em seu aspecto físico, sem levar em conta a presença humana. A ecologia em sua feição pós-moderna foi entendida no âmbito ideológico como apropriação do capital e atuação em pautas estratégicas: a construção de previsões cataclísmicas em relação à integridade do meio ambiente a nível global, a utilização desta justificativa para responsabilizar toda a sociedade pelos prejuízos ambientais gerados por um grupo de países hegemônicos; a difusão do ideal de desenvolvimento sustentável a partir dos meios educativos com a narrativa central de que a ação do individuo é que pode resolver os problemas que a sociedade enfrenta; a utilização de publicidade ambiental em mercadorias para escamotear a ação destrutiva das empresas; a defesa da pauta ambientalista dentro de territórios para criação de reservas ecológicas a serem geridas (exploradas) pelo capital privado, etc. Enfim, as feições mercantis do ambientalismo que acabam utilizando o discurso ecológico para criar falsas soluções para os problemas ambientais e deixar o capital privado livre para avançar sobre os recursos e externalizar os prejuízos da produção sobre o meio ambiente e a sociedade.
Estas questões levaram o grupo a compreender como a criação de novos mercados pautados nas propostas de sustentabilidade, como o “mercado de carbono” e de “pagamentos por serviços ambientais” no bojo da “economia verde”, tem ganhado espaço a partir da flexibilização de legislações ambientais. No caso brasileiro a partir da reconfiguração do código florestal, que, além de autorizar o agronegócio a avançar sobre os territórios, está a abrir brechas na lei para a regulamentação de uma forma nefasta de mercado, onde os serviços e produtos gerados pela natureza, considerados bens comuns, são financeirizados e transformados em mercadorias negociáveis. O grande capital passará a lucrar com a proteção do meio ambiente enquanto fica livre para continuar lucrando com sua destruição, e a sociedade como um todo irá pagar a conta das compensações na forma de pagamento por serviços ambientais. Neste meio o pequeno agricultor acaba levando os maiores prejuízos por conta do aumento da operosidade do agronegócio e de uma legislação ambiental que protege os latifundiários e é rígida com a agricultura familiar.
É fundamental para as lideranças e militantes do MPA compreender estes processos: a maneira como se movimenta a empresa capitalista no campo, sua articulação com manobras no aparelho do estado e com a ação do capital financeiro internacional. A identificação clara das feições que o império toma para adentrar os territórios, a partir de estratégias ligadas à proteção do meio ambiente, e a forma como as elites agrárias brasileiras tem utilizado estas estratégias para intensificar a opressão de classe sobre o campesinato. Sendo as ameaças ainda mais sérias para o nordeste e o semiárido como um todo, onde a destruição das áreas de proteção dos rios temporários pode consentir em graves prejuízos para o povo do campo e abrir maior espaço para a entrada do agronegócio explorar os territórios.
O espaço de formação demonstrou ser bastante produtivo, e, apesar da complexidade dos temas trabalhados, o grupo como um todo demonstrou um bom aproveitamento deste estudo que se faz necessário aos processos de organização e luta nos diversos territórios.
Caruaru, 10 de setembro de 2012