domingo, 27 de março de 2011

Conferência na Alemanha é dedicada aos 20 Anos do IRPAA

Agricultura adaptada ao semiárido brasileiro, discussão sobre o modelo de desenvolvimento, relações de poder nas diferentes classes sociais, urbanização e condições de vida, cultura e resistência no Nordeste do Brasil, além das condições políticas e econômicas da transposição do Rio São Francisco são os temas centrais da Conferência que está acontecendo nestes dias 25, 26 e 27 de março em na Alemanha.
A conferência objetiva discutir a economia agrária industrial ou biológica e é dedicada aos 20 anos de atuação do Irpaa, destacando a viabilidade da Convivência com o Semiárido e a o trabalho desenvolvido pelo Instituto no Semiárido brasileiro ao longo das duas décadas.
Na manhã deste sábado, representantes do Irpaa presentes no evento irão proferir a palestra “20 anos de IRPAA e Convivência”. Durante a tarde, contribuirão nas mesas de discussão sobre “Modelo de desenvolvimento para o Nordeste do Brasil: industrial ou ecológico?” e “Urbanização e condições de vida no semiárido do Nordeste do Brasil”. Outras atividades, a exemplo de palestras em escolas, reuniões, visitas aos grupos apoiadores da proposta da Convivência com o Semiárido também tem demandado a participação dos membros da coordenação do Irpaa, Ademilson da Rocha (Tiziu) e Haroldo Schistek, que estão representando a entidade no país europeu.
A transposição do Rio São Francisco também tem sido um dos temas mais abordados nas atividades. Em entrevista publicada no site da entidade Kinder-Missionswerk -Die Sternsinger, Ademilson da Rocha fala sobre os impactos negativos que o projeto faraônico trará para as famílias do Semiárido, sobretudo para as crianças e para o meio ambiente, e o que a população pode fazer na Alemanha para lutar por um abastecimento de água justo no mundo.


Fonte: http://www.irpaa.org/noticias/270/conferencia-na-alemanha-e-dedicada-aos-20-anos-do-irpaa
e http://www.sternsinger.org/1512.html

sexta-feira, 25 de março de 2011

Carta Final do Encontro dos/as Atingidos/as pela Mineração na Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, realizado em Ouro Preto (MG), 19 a 22/03/2011
 
Mineração: Bem privado, mal público!
 
Nós, organizações e movimentos populares vindos de vários cantos das Bacias Hidrográficas do Rio São Francisco, Rio Doce, Rio Jequitinhonha e Paraíba do Sul, nos reunimos nos dias 19 a 22 de março de 2011, em Ouro Preto, Minas Gerais, no Encontro dos Atingidos e Atingidas pela Mineração na Bacia do Rio São Francisco. Diante do quadro atual da degradação causada pela atividade de mineração e em meio à omissão dos nossos governantes, vimos por essa carta defender a água como bem público fundamental à vida humana e à biodiversidade e exigir o direito ao uso prioritário das águas pelas comunidades.
Nesses dias, pudemos constatar que o Estado tem sido o principal promotor dessa sanha voraz de produção e extração de minérios em grande escala, que tem diminuído e contaminado a nossa água e machucado a Terra, deixando-a em carne viva. Vimos oceanos de rejeitos, expostos a céu aberto – “cemitérios de ecossistemas” – prova dos nove do processo degradante. Vimos minerodutos que consumirão um volume de água suficiente para abastecer uma cidade de 200 mil habitantes, mas cujo uso está restrito ao transporte de ferro. Mas, vimos e ouvimos, sobretudo, pessoas machucadas em sua alma, marcadas na carne, adoecidas, expulsas de suas terras, ameaçadas pelo que os poucos interessados chamam simplesmente de “crescimento”, como o novo nome do “desenvolvimento”.
Mais que bem indispensável à vida, a água para nós é dotada de valores sociais, biológicos, ambientais, medicinais, culturais e religiosos, e deve ser assegurada à atual e às futuras gerações com padrões de quantidade e qualidade adequados aos respectivos usos.
A Mineração é a atividade econômica que mais gera degradações aos recursos hídricos e estamos aqui para enfrentar e dizer não a este modelo atual de exploração minerária. Terra, água, territórios e pessoas não podem ser reduzidos a “reserva mineral” ou “jazida”. Territórios “ferríferos” antes são territórios “aqüíferos”, lugar da vida!
As outorgas, que foram e estão sendo concedidas, poderão ser mais um elemento a agravar esta realidade. A maneira como estão sendo concedidas para os empreendimentos de mineração, seja para utilização de água na planta industrial e no transporte do minério, seja para barragem de rejeitos, não considera efetivamente os impactos sobre a qualidade e a quantidade das águas, por exemplo, o rebaixamento do lençol freático e a poluição dos mananciais.
Para garantia do bem estar público, autorizações e licenciamentos da esfera pública não podem se restringir a juízos cobertos apenas pela aparência de cumprimento de “legalidade”, já que não faltam evidências das conseqüências negativas geradas pela exploração pouco criteriosa dos minérios. Ritos legais são inócuos se a razão maior da formalidade - a seguridade do direito coletivo - é jogada por terra em nome de direitos privados.
Diante da urgência e da gravidade que a preservação de nossas águas impõe, resta-nos perguntar – Água ou Mineração: o que a sociedade quer?
Para nós, a resposta está clara: a mineração, ao contrário do que dizem as nossas leis, não tem sido de utilidade pública. É, antes de tudo, um bem privado, com lucros na mão de poucos, a custo de um grande sofrimento das populações atingidas e que acarreta um enorme mal público.
O processo de elaboração do Marco Regulatório da Mineração e do Plano Nacional de Mineração não pode ser um conluio entre empresários e governantes. A sociedade é convocada a se interessar, interferir e determinar este debate.
Nós queremos um ambiente digno para o ser humano e para toda a comunidade da vida. Para tal, teremos que mudar profundamente o modo como se processa o modelo de mineração no Brasil e no mundo e estamos dispostos a iniciar essa mudança desde já, dizendo não a esse atual modelo de mineração e de consumismo.
 
Assinam as organizações, associações e entidades: Associação Casa de Eva Barranco da Esperança e Vida de Porteirinha/MG, Assembléia Popular de Sergipe, Comissão Pastoral da Terra –BA/MG, Coordenação Regional Quilombola do Oeste da Bahia, Cáritas Brasileira Nordeste 3, Comissão Paroquial de Meio Ambiente de Caetité/BA, Centro de Agroecologia do Semi-árido/Guanambi (BA), Movimento pelas Serras e Águas de Minas (MOVSAM), Sindicatos dos Trabalhadores Rurais (STRs) de Remanso, Pindaí, Campo Formoso, Bom Jesus da Lapa, na Bahia, e de Porteirinha, Riacho dos Machados, Simonésia, Espera Feliz, em Minas Gerais, Movimento dos Trabalhadores Assentados, Acampados e Quilombolas da Bahia – CETA, Paróquia de Santo Antonio de Salinas/ Fruta de Leite, Pastoral da Criança de Riacho dos Machados, Movimento de Mulheres Camponesas de Sergipe – MMC/SE.

Fonte: Site da CPT Nacional

quinta-feira, 24 de março de 2011

Cadê o social do BNDES?

                 
O economista Gabriel Strautman, secretário executivo da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais e representante da Plataforma BNDES, é enfático ao criticar o apoio do BNDES às grandes obras de infraestrutura no país e, principalmente, os megaeventos planejados para acontecerem no Brasil nos próximos anos. Confira a entrevista concedida ao IHU On-Line.

A principal questão levantada por Strautman na entrevista que concedeu à IHU On-Line por telefone é a falta de transparência do banco quanto aos projetos que ele financia, tanto no que diz respeito aos juros aplicados quanto aos métodos de avaliação dos projetos aprovados. “OBNDES tem buscado fazer com que as indústrias que ele apoia se transformem em empresas orientadas para a globalização, com capacidade de disputar mercados globais. Portanto, não estamos falando de diversificação da economia doméstica, de maior integração regional dentro do país”, relatou.

Gabriel Strautman é economista formado pela Universidade de Brasília e mestre em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. 

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Qual é o papel do BNDES no setor produtivo brasileiro de hoje? O banco tem cumprido seu papel social?

Gabriel Strautman – Não, ele não tem cumprido um papel social. O nome do bando é Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Embora incorpore o social na sua sigla, ele tem focado só no plano econômico. E tem agido num só sentido de desenvolvimento econômico que não privilegia um projeto de sociedade e economia redistributiva que reduza as desigualdades no Brasil. O BNDES hoje cumpre cada vez mais um papel importante no financiamento da política industrial brasileira e financia uma política econômica voltada apenas para o crescimento da economia a despeito dos direitos da população, da necessidade da redução das desigualdades e do cuidado e do zelo ao meio ambiente do Brasil.

IHU On-Line – Podemos dizer que o BNDES se tornou, nos últimos anos, o principal banco financiador dos grandes projetos no Brasil?

Gabriel Strautman – Certamente, e não apenas no Brasil como também na América Latina. O BNDES, desde 2003, se tornou uma ferramenta central no financiamento do desenvolvimento do Brasil, desbancando antigas instituições financeiras multilaterais como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no papel de principais atores do financiamento do desenvolvimento. Isso, obviamente, do ponto de vista dos bancos. 

"O BNDES a partir do governo Lula se tornou 
o segundo maior banco de desenvolvimento do mundo"

O BNDES a partir do governo Lula se tornou o segundo maior banco de desenvolvimento do mundo. Ele supera os financiamentos do BID e do Banco Mundial somados na América Latina. Então, o BNDES hoje está por trás dos grandes projetos energéticos, como as usinas hidrelétricas dos rios Madeira, Jirau e Santo Antônio, assim como o questionável projeto de Belo Monte. Além disso, está por trás dos principais projetos destruidores do meio ambiente do Brasil. Entre seus financiados ainda estão a Companhia Siderúrgica do Atlântico e a Vale. Hoje, o BNDES está preparado também para financiar a construção de seis usinas hidrelétricas na Amazônia Peruana.

IHU On-Line – Luciano Coutinho, presidente do BNDES, diz que muitos dos investimentos que o banco tem feito evitam, em diversos casos, que as empresas beneficiadas quebrem. O que seria da economia brasileira atual sem o BNDES?

Gabriel Strautman – Não há dúvida que o BNDES é uma ferramenta importante para o desenvolvimento da nossa economia. Mas o que questionamos é porque o banco financia um projeto tão polêmico quanto Belo Monte e não incentiva o avanço da pequena indústria, por exemplo? E mais do que isso: Por que o BNDES não apoia o desenvolvimento da economia solidária? Não há dúvida de que o BNDES é um ator importante no desenvolvimento econômico do país. Ponto. Mas ele precisa financiar outras coisas e não apenas os projetos cuja viabilidade econômica é questionável.

IHU On-Line – Como o senhor avalia a forma como as empresas se utilizam dos financiamentos promovidos pelo banco?

Gabriel Strautman – A estratégia do BNDES no apoio às indústrias no Brasil se dá de maneira concentrada e problemática. Isso porque não existe transparência na maneira como ele apoia esses projetos. Por exemplo: o banco, quando analisa um projeto como Belo Monte ou a própria Vale, não diz para a sociedade brasileira como faz essa avaliação; ele não apresenta como classifica esses projetos e empresas quanto ao risco ambiental; e não mostra a taxa de juros com a qual ele subsidia os financiados. 

O BNDES não tem transparência. O banco sempre alega sigilo bancário para não repassar essas informações. E justamente por isso não temos elementos para entender a forma como o BNDES trata essas empresas e projetos. E isso demonstra que o banco trata de maneira privilegiada um pequeno grupo de grandes empresas que recebem verba do tesouro nacional a partir da emissão de títulos da dívida pública brasileira. Ou seja, são todos os brasileiros e brasileiras que beneficiam empresas concentradoras da atividade econômica e causam grandes impactos na vida das pessoas e também do meio ambiente.

IHU On-Line – Em relação à Copa do Mundo de Futebol de 2014, como avalia o apoio que o BNDES tem dado às obras produzidas para esse evento?

Gabriel Strautman – Com base nisso tudo que acabei de falar, que olhamos para a atuação do banco no que diz respeito aos financiamentos dos megaeventos e levantamos uma série de questionamentos. Quando olhamos o que o BNDES está fazendo, percebemos que ele está preparado para dar um apoio de 4,8 bilhões de reais em ações de infraestrutura urbana, mas também na reforma de estádios. 

Em termos de arenas esportivas, a nossa questão é a seguinte: em várias cidades questiona-se a construção de novos estádios quando o que poderia ser feito era justamente a reforma de arenas antigas. E o BNDES não explicita as razões pelas quais ele preferiu apostar na construção de uma nova arena em vez de reformar uma que já existe. Como o banco não tem transparência, não temos dados suficientes para cobrar esse tipo de questão. 

No Rio de Janeiro vai ser construída uma grande via urbana que vai ligar a Tijuca ao aeroporto internacional da cidade. Ora, quando a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) defenderam a Copa do Mundo de Futebol e os Jogos Olímpicos eles falaram que trariam benefícios para a cidade e para o conjunto da sociedade como um todo. Então, por que apenas ligar uma zona da cidade que já é conhecida pela valorização imobiliária com o aeroporto internacional? Estamos falando que só uma parte da cidade pode receber melhoras em termos de infraestrutura urbana? Essas questões também valem para a Caixa Econômica Federal, que vai financiar todo tipo de mobilidade urbana necessária. Por que não consultaram a população como um todo? Por que só as intervenções defendidas pelo COB e CBF foram levadas adiante? É dinheiro público que estão usando!

O discurso do Sr. Carlos Arthur Nuzman e do Sr. Ricardo Teixeira, quando esses eventos foram anunciados para o Brasil, era de que as duas iniciativas seriam financiadas com dinheiro privado. E agora vemos que 98,5% do dinheiro que vai financiar as iniciativas para a Copa e para as Olimpíadas é público. 

IHU On-Line – Quem sai beneficiado dessa aliança entre o BNDES e os megaeventos como a Copa e as Olimpíadas?

Gabriel Strautman – Em primeiro lugar, todo mundo que está associado a esse projeto. Comitê Olímpico Internacional (COI),Federação Internacional de Futebol (Fifa), CBF e COB, esses senhores que se intitulam donos dos jogos, são os principais responsáveis por se capitalizarem nessa história. São eles que fazem contratos com as grandes empresas apoiadoras, seja do campo imobiliário seja as principais empresas de marketing esportivo. É um punhado de grandes empresas, tais comoOdebrecht e Camargo Correa.

IHU On-Line – A princípio, a Copa do Mundo vai custar 17 bilhões de reais, enquanto isso se gasta 13 bilhões de reais com o Bolsa Família por ano. Como vê as cifras da Copa quando colocadas frente a frente com projetos que foram tidos como prioritários pelo governo?

Gabriel Strautman – A Dilma deu uma declaração em que afirmou que os investimentos para a Copa podem chegar a 33 bilhões de reais. Precisamos fazer esse e ainda outros cálculos como: quanto se gasta com reforma agrária no Brasil por ano? Quanto é o salário de um professor do Ensino Médio das principais cidades brasileiras? Com o dinheiro que vai ser gasto com a Copa do Mundo de futebol quantos professores poderiam ser contratados e qual salário poderia ser pago com isso? Essas comparações são urgentes!

O Brasil só tem privilegiado grandes projetos de infraestrutura e sempre com o discurso que isso vai desenvolver a economia, que vai gerar emprego. Esse mesmo discurso vale para os megaeventos. “Os megaeventos vão trazer investimentos internacionais”... “Empregos serão gerados”. Só que são empregos que vão ser gerados até o fim da Copa. E depois? Além disso, serão empregos gerados de maneira precária, ou seja, a maioria será terceirizada com menos direitos trabalhistas. É preciso que se diga isso. 

Por outro lado, se investimentos de longo prazo forem feitos, como reforma agrária, educação, mobilidade urbana, acesso às cidades, avanços de direitos, a sociedade poderá ter acesso a direitos permanentes. Acabamos ficando presos em uma espécie de armadilha e num ciclo vicioso preso numa ilusão de que esses projetos de curto prazo trarão benefícios de longo prazo. 

No dia em que o povo brasileiro perceber que o valor de uma entrada de partida de futebol será tão cara que, com o seu salário, não será possível comprar o ingresso para o jogo, aí perceberão que a Copa do Mundo não é um evento popular.

IHU On-Line – Qual é o papel do BNDES na formação do capitalismo brasileiro ao longo das últimas décadas?

Gabriel Strautman – O BNDES vai fazer 60 anos em 2012. Até 2003 ele tinha um papel importante de financiamento da indústria, mas esse papel passou a ser muito mais relevante depois de 2003. Ele foi responsável, na ditadura particularmente, por financiamentos de grandes projetos, assim como faz hoje. A diferença é que até 2003 os megaprojetos recebiam mais dinheiro do Banco Mundial. Só que isso não é suficiente. 

Além disso, o BNDES tem buscado fazer com que as indústrias que ele apoia se transformem em empresas orientadas para a globalização, com capacidade de disputar mercados globais. Portanto, não estamos falando de diversificação da economia doméstica, de maior integração regional dentro do país... Por isso, é preciso lutar para que o BNDES se democratize e isso começa pela pressão por maior transparência em relação aos dados do banco.

IHU On-Line – Como o senhor vê o funcionamento da Plataforma BNDES? Esse grupo tem sido ouvido e respeitado pelo banco?

Gabriel Strautman – A Plataforma BNDES é uma experiência muito importante porque ela parte de um trabalho que já era feito pelo Banco Mundial e começa a aplicar numa instituição brasileira. O BNDES precisa ser uma instituição mais democrática. A Plataforma BNDES começou a questionar isso tudo em 2007, construiu um documento muito interessante que não fica apenas na crítica ao banco, mas avança no sentido de alternativas para o BNDES e, a partir disso, instala um processo de diálogo com o banco. Como é um banco que não tem cultura de participação de acesso às informações, ele não apostou no diálogo com aPlataforma BNDES.